Produção de etanol no Brasil e aproveitamento dos resíduos

Produção de etanol no Brasil e aproveitamento dos resíduos

O Brasil é o segundo maior produtor de etanol no mundo. Entenda como é feita a produção deste biocombustível e como seus resíduos tem sido reaproveitados em soluções sustentáveis e inovadores para a economia.

O que é etanol?

Etanol, também conhecido como álcool etílico, é um biocombustível produzido principalmente a partir da fermentação de açúcares presentes em matérias-primas vegetais, como a cana-de-açúcar e o milho.

Por ser derivado de fontes de energia renováveis, é uma alternativa mais sustentável aos combustíveis derivados de petróleo.

O etanol é encontrado em duas formas principais: o etanol anidro e hidratado. A diferença entre as duas formas é o teor de água em sua composição:

  • Etanol anidro: Este tipo de etanol contém uma quantidade mínima de água, geralmente menos de 1%. Ele é utilizado como aditivo na gasolina, formando a gasolina C, que é a única gasolina comercializada no Brasil. A mistura de etanol anidro na gasolina pode variar entre 20% e 25%, dependendo das regulamentações vigentes. Esse etanol recebe um corante laranja para evitar fraudes.
  • Etanol hidradato: Contém uma porcentagem de água maior, cerca de 5%. Este tipo de etanol é utilizado diretamente no abastecimento de veículos, sendo comercializado em postos de combustível.

A diferença entre etanol e gasolina

A principal diferença entre etanol e gasolina está na eficiência energética e na origem. A gasolina, derivada do petróleo, oferece maior rendimento por litro, enquanto o etanol, de origem vegetal é mais sustentável, mas com rendimento um pouco menor.

A escolha entre um e outro depende de fatores como preço, nível de consumo e necessidades de uso do veículo.

Como o etanol é utilizado

No Brasil, cerca de 80% da produção de etanol é destinada ao uso como combustível, porém, o produto é muito versátil e tem diversos outros usos, como:

  • Bebidas alcóolicas
  • Vinagres
  • Solventes
  • Desinfetantes
  • Fabricação de plásticos
  • Medicamentos
  • Tintas
  • Produtos de limpeza
  • Agente esterilizante

A produção de etanol

Principais matérias-primas

As duas principais matérias-primas para a produção do etanol são a cana-de-açúcar e o milho.

Cana-de-açúcar

No Brasil, a cana-de-açúcar é a principal matéria prima na produção do etanol, popular pela sua alta produtividade e eficiência. O caldo de cana é rico em sacarose, que é facilmente convertida em etanol durante o processo de fermentação.

O rendimento do processo é potencializado pelo reaproveitamento dos subprodutos como o bagaço da cana para geração de energia ou produção de etanol de segunda geração (2G).

Milho

Nos Estados Unidos, o etanol é produzido, principalmente, com uso do milho como matéria-prima. No Brasil, o milho tem ganhado espaço, especialmente por ser uma opção para as regiões onde o cultivo da cana não é viável.

O milho oferece uma vantagem importante: pode ser armazenado e processado durante todo o ano, o que permite a produção de etanol mesmo na entressafra da cana-de-açúcar.

Esta matéria-prima também gera subprodutos que podem ser reaproveitados, como o óleo de milho e DDGS (grãos secos de destilaria com solúveis), utilizados na nutrição animal.

Etapas da produção de etanol

As etapas de produção do etanol garantem a pureza do produto final. Acompanhe o processo produtivo do etanol a partir da cana-de-açúcar:

Lavagem

A primeira etapa da produção de etanol é a lavagem, na qual a cana-de-açúcar é submetida a uma limpeza rigorosa para remover poeira, areia, terra e outras impurezas. O processo conta com uma etapa de eletroímã que garante que qualquer tipo de material metálico também seja removido.

Esta etapa garante que a matéria-prima esteja livre de contaminantes que possam comprometer a qualidade do etanol.

Moagem

Após a lavagem, a cana-de-açúcar é moída por grandes rolos trituradores. Essa moagem transforma a cana em líquido, conhecido como melado. O que sobre deste processo (cerca de 30% do produto original) é chamado de bagaço, que não é desperdiçado.

O bagaço é um subproduto muito valioso que pode ser utilizado na geração de energia dentro da própria usina, contribuindo para a autossuficiência energética do processo.

Refino do melado

O melado extraído na moagem ainda contém impurezas, como restos de bagaço e areia, que precisam ser eliminadas. Para isso, o líquido passa por um processo de peneiração e decantação, onde as impurezas são separadas e o melado puro, agora denominado caldo clarificado, é obtido.

A esterilização do caldo, realizada por aquecimento, elimina quaisquer micro-organismos presentes, preparando-o para a próxima etapa do processo.

Fermentação

A fermentação é o coração do processo de produção de etanol. Nessa fase, o caldo clarificado é transferido para grandes tanques, onde é misturado com leveduras, normalmente da espécie Saccharomyces cerevisiae.

Essas leveduras se alimentam do açúcar presente no caldo, convertendo-o em etanol e gás carbônico. Esse processo de fermentação dura várias horas e resulta em um líquido chamado vinho fermentado, que contém cerca de 10% de etanol, além de leveduras e açúcar não fermentado.

Destilação

O próximo passo é a destilação, onde o etanol é separado do vinho fermentado. O líquido é aquecido em colunas de destilação, onde o etanol se evapora e, em seguida, é condensado, separando-se do restante da mistura.

O produto final dessa etapa é o etanol hidratado, com um teor alcoólico de aproximadamente 96%, que pode ser utilizado diretamente como combustível.

Desidratação

Para produzir o etanol anidro, que é misturado à gasolina para formar a gasolina C, é necessário remover quase toda a água restante no etanol hidratado.

A desidratação pode ser feita por diferentes métodos, como a utilização de solventes ou peneiras moleculares que retêm apenas as moléculas de água. O resultado é um etanol com pureza de cerca de 99,5%, pronto para ser utilizado como aditivo na gasolina.

Armazenamento e transporte

Após a desidratação, tanto o etanol anidro quanto o hidratado são armazenados em grandes tanques e estão prontos para serem transportados para as distribuidoras.

Impactos ambientais

A queima do etanol é mais limpa em comparação aos combustíveis fósseis como gasolina e diesel. Seu uso como combustível pode ajudar a reduzir de forma significativa os gases que contribuem para o efeito estufa, como o dióxido de carbono (CO₂).

O processo produtivo é baseado na cana-de-açúcar e milho, que são culturas que podem ser cultivadas de maneira sustentável. Práticas agrícolas modernas tem sido utilizadas para minimizar o impacto ambiental, reduzir desperdícios e evitar a contaminação do solo e das águas.

Um dos pontos de atenção, no entanto, é sobre a expansão da produção de cana-de-açúcar em novas áreas. Estudos indicam que a essa expansão resulta em desmatamento e conversão de terras que antes eram utilizadas para outras culturas agrícolas ou pastagens.

Isso pode ter consequências negativas, como a perda de biodiversidade e a competição por terras aráveis, o que torna essencial o desenvolvimento de políticas públicas que equilibrem a expansão do etanol com a preservação ambiental.

A queima da cana

A queima da cana-de-açúcar é uma técnica utilizada para facilitar o corte manual, eliminando a palha e as folhas secas da planta antes da colheita. Ela agiliza o processo do corte, porém, apresenta alguns impactos ambientais e sociais que têm sido amplamente questionados.

O que é a queima controlada?

Queima controlada é o uso planejado e supervisionado do fogo em atividades agropastoris, florestais ou de pesquisa científica. É feito dentro de limites previamente definidos e deve possui a aprovação dos órgãos ambientais competentes.

Essa técnica é empregada em locais onde o fogo pode ser uma ferramenta útil para o manejo do solo, controle de pragas ou preparação do terreno para novos cultivos, desde que realizada de forma segura e controlada, evitando incêndios descontrolados e danos ao meio ambiente.

De acordo com o Código Florestal, a queima controlada é permitida em certas situações, como em áreas de agricultura de subsistência para populações tradicionais e indígenas, ou em regiões onde as peculiaridades justificam o uso do fogo.

É importante ressaltar que esse processo exige um planejamento rigoroso, considerando as características do terreno, vegetação e fatores climáticos, como vento e umidade, para garantir que os objetivos sejam alcançados sem prejuízos ambientais.

Quais os problemas ou impactos gerados pela queima da cana?

A queima da cana libera uma quantidade significativa de gases nocivos à atmosfera, como monóxido de carbono (CO), metano (CH4) e óxidos de nitrogênio (NO2), que contribuem para o aquecimento global e a formação de ozônio na baixa atmosfera.

Além disso, a fuligem e as partículas finas geradas pela queima afetam diretamente a qualidade do ar, aumentando os casos de doenças respiratórias. Por este motivo, o procedimento tem sido alvo de debates e planejamentos que visam a sua substituição gradual por outros métodos.

É proibido queimar cana?

A queima da cana-de-açúcar é proibida em muitos estados, sendo que a regulamentação varia de acordo com a legislação local. Ainda assim, as legislações estaduais geralmente incluem planos para a eliminação gradual e substituição dessa prática, com o objetivo de minimizar os impactos ambientais e sociais negativos que ela causa.

No ano de 2024, a CETESB – Companhia Ambiental do Estado de São Paulo, estabeleceu a proibição da queima da palha de cana-de-açúcar no período de 1º de julho a 30 de novembro. A justificativa para essa suspensão é a necessidade de resguardar e melhorar a qualidade de vida e saúde da população, especialmente em momentos em que as condições atmosféricas são desfavoráveis, como durante o inverno e períodos de seca, quando a dispersão de poluentes é mais difícil e agrava os impactos da poluição na saúde pública.

Sustentabilidade e resíduos

Quando comparado a outros compostos, como o petróleo e seus derivados, o etanol tem a vantagem de ser rapidamente absorvido e degradado, tanto no ar quanto na água.

Por ser altamente volátil e biodegradável, o etanol não tende a acumular no meio ambiente. Em casos de vazamento ou derramamento, seja durante o transporte, armazenamento ou uso industrial, o etanol é rapidamente degradado por processos naturais.

Os resíduos gerados em seu processo produtivo podem ser reaproveitados, o que também contribui na redução do impacto ambiental e agrega valor econômico ao processo, criando um ciclo sustentável e eficiente.

Os subprodutos da produção de etanol

A produção de etanol gera subprodutos que podem ser aproveitados para diversas finalidades. Estes subprodutos incluem a palhagem, o bagaço, a vinhaça, a torta de filtro e a água de lavagem.

Palhagem

Gerada durante a colheita da cana, a palhagem é composta por folhas e ponteiros da cana-de-açúcar. Este subproduto é utilizado no solo para melhorar a qualidade da terra, ele ajuda a proteger contra erosão e a reter nutrientes. Também é possível utilizá-la na geração de energia.

Bagaço

O bagaço é um resíduo fibroso gerado na etapa de extração do caldo da cana. Com alto poder calorífico, o bagaço é muito utilizado na cogeração de energia nas próprias usinas. Esta prática ajuda a suprir as necessidades energéticas e gera renda, pois a energia excedente pode ser comercializada.

O bagaço também pode ser utilizado na fabricação de papel, ração animal e etanol de segunda geração (2G).

Vinhaça

A vinhaça é um resíduo líquido gerado durante a destilação do etanol. Frequentemente utilizada como fertilizante na fertirrigação de canaviais, é rica em potássio e outros nutrientes essenciais para o solo.

Torta de filtro

A torta de filtro é resultado do processo de clarificação do caldo de cana. Por ser rica em matéria orgânica e nutrientes como cálcio e fósforo, é amplamente utilizada como adubo orgânico nos canaviais.

Água de lavagem

A água proveniente do processo de lavagem da cana antes da moagem pode ser reutilizada no contexto industrial para minimizar o uso de água fresca. Os sistemas de reuso de água são muito importantes na redução do impacto ambiental e ajudam a conservar os recursos hídricos.

Tecnologia no reaproveitamento de resíduos

As indústrias estão cada vez mais focadas em desenvolver tecnologias que aproveitem de maneira eficiente os resíduos gerados em seus processos produtivos. O objetivo é minimizar o impacto ambiental e transformar estes resíduos em produtos de alto valor.

Veja algumas tecnologias que têm sido empregadas no reaproveitamento dos resíduos da produção de etanol:

Transformação de vinhaça em hidrogênio verde

Desenvolvida no Brasil, esta tecnologia inovadora transforma a vinhaça em hidrogênio verde a partir da utilização de um reator eletrolítico. O equipamento quebra as moléculas de água presentes na vinhaça, produzindo hidrogênio e oxigênio.

O hidrogênio verde, produzido sem emissões de CO2, pode ser utilizado em várias aplicações, incluindo a produção de amônia para fertilizantes, o abastecimento de veículos com células a combustível e na própria combustão do bagaço da cana.

Etanol de Segunda Geração (2G)

Diferente do etanol de primeira geração, que utiliza o caldo da cana-de-açúcar, o etanol 2G é produzido a partir de resíduos lignocelulósicos, como o bagaço de cana e outros resíduos agrícolas. Este processo permite aumentar significativamente a capacidade produtiva de etanol por hectare, aproveitando matérias-primas que poderiam ser descartadas.

O etanol 2G melhora a eficiência energética, reduz as emissões de gases de efeito estufa e amplia a sustentabilidade da produção ao diminuir a pressão sobre culturas alimentares, promovendo um uso mais equilibrado dos recursos naturais.

Produção de plástico biodegradável

Através da fermentação do bagaço em combinação com outros materiais orgânicos, é possível produzir o poliácido lático (PLA), um bioplástico que se decompõe no ambiente sem deixar resíduos tóxicos. Este plástico biodegradável pode ser utilizado em uma ampla gama de produtos, como embalagens, utensílios descartáveis e sacolas, oferecendo uma alternativa sustentável aos plásticos convencionais.

Concreto de bagaço de cana

Na construção civil, o bagaço de cana está sendo explorado como matéria-prima para o desenvolvimento de um novo material de construção chamado Sugarcrete. Este material é significativamente mais leve que o concreto tradicional e possui emissões de carbono 20 vezes menores. O Sugarcrete pode ser utilizado em painéis de isolamento, blocos de suporte de carga e pisos estruturais, oferecendo uma solução de baixo carbono para a construção civil.

Conclusão

O Brasil se destaca na produção de etanol, e o compromisso com a sustentabilidade é fundamental. O aproveitamento de subprodutos, como o bagaço e a vinhaça, em novas tecnologias, reforça a importância desse combustível e abre oportunidades para promover ciclos produtivos mais limpos e eficientes.

Essa abordagem fortalece a economia e contribui para um futuro mais sustentável a partir da integração de inovação e responsabilidade ambiental no setor energético.

Acompanhe o blog da Zanini Renk para saber mais sobre o universo da indústria e fique por dentro das novidades.

Fontes:

Jornal da USP. Tecnologia brasileira quer transformar resíduo da produção de etanol em hidrogênio verde. 2022.

UDOP - União Nacional da Bioenergia. Sugarcrete: Conheça o Concreto Inovador Feito a Partir do Bagaço de Cana-de-açúcar. 2023.

NUNES, F. E. Cana-de-açúcar: a produção de etanol e seus benefícios. 2017.

Centro de Conhecimento em Bioenergia. Diferenças entre o etanol de milho e de cana-de-açúcar.

Mais
Conteúdos